Me arde uma alegria, que não aceita ser felicidade,
porque a felicidade é uma palavra
muito longa e a alegria tem pressa.
Uma alegria de deitar na grama
e sentir que está molhada e
não se importar com a roupa orvalhada
e não se importar com a hora
e com os modos,
uma alegria que é inocência,
mas sem culpa para acabá-la.
Uma alegria que é descobrir os objetos no escuro.
Uma alegria repentina,
que me faz entortar o rosto para rir,
que não me faz pôr a mão
na boca com medo dos dentes,
que me impede de me proteger.
Uma alegria como um tapete
que fica somente curtido no centro.
Uma alegria de ficar com pena
dos anjos e de suas asas pesadas
como duas montanhas nas costas,
suas asas como dois irmãos brigando
em dia de chuva.
Uma alegria de perceber que quanto
mais gasto o tempo com os outros
mais sobra para mim.
Uma alegria que não volta
para a estante porque não saiu
de nenhum livro lido.
Uma alegria que se antecipa
e faz sala ao quarto.
E quase me faz acreditar que sou possível.
Fabrício Carpinejar
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