Qual o elogio que uma mulher adora receber?
Bom, se você está com tempo,
pode-se listar aqui uns setecentos:
mulher adora que verbalizem seus
atributos, sejam eles físicos ou morais.
Diga que ela é uma mulher
inteligente, e ela irá com a sua cara.
Diga que ela tem um ótimo caráter e um corpo que é uma
provocação, e ela decorará o seu número.
Fale do seu olhar, da sua pele,
do seu sorriso, da sua presença de espírito, da sua aura de mistério, de como
ela tem classe:
ela achará você muito
observador e lhe dará uma cópia da chave de casa.
Mas não pense
que o jogo está ganho: manter o cargo vai depender da sua perspicácia para
encontrar novas qualidades nessa mulher poderosa, absoluta.
Diga que ela cozinha melhor que a sua mãe, que ela tem
uma voz que faz você pensar obscenidades, que ela é um avião no mundo
dos negócios.
Fale sobre sua competência, seu senso de oportunidade, seu bom
gosto musical.
Agora quer ver o mundo cair?
Diga que ela é muito
boazinha.
Descreva aí uma mulher boazinha.
Voz fina, roupas pastel,
calçados rente ao chão.
Aceita encomendas de doces, contribui para a
igreja,
cuida dos sobrinhos nos finais de semana.
Disponível, serena,
previsível, nunca foi vista negando um favor.
Nunca teve um chilique!!!!
Nunca colocou os pés num show de rock.
É
queridinha...Pequeninha...Educadinha.
Enfim, uma mulher boazinha.
Fomos
boazinhas por séculos.Engolíamos tudo e
fingíamos não ver nada, ceguinhas.
Vivíamos no nosso mundinho, rodeadas de panelinhas e
nenezinhos.
A vida feminina era esse frege: bordados, paredes
brancas, crucifixo em cima da cama, tudo certinho.Passamos um tempão assim, comportadinhas, enquanto íamos
alimentando um desejo incontrolável de virar a mesa.
Quietinhas, mas
inquietas.
Até que chegou o dia em que deixamos de ser as
coitadinhas.
Ninguém mais fala em namoradinhas do Brasil: somos atrizes,
estrelas, profissionais.
Adolescentes não são mais brotinhos: são garotas da
geração teen.
Ser chamada de patricinha é ofensa mortal.
Pitchulinha é
coisa de retardada.
Quem gosta de diminutivos, definha.
Ser boazinha não
tem nada a ver com ser generosa.
Ser boa é bom, ser boazinha é péssimo.
As
boazinhas não têm defeitos.
Não têm atitude.
Conformam-se com a
coadjuvância.
PH neutro.
Ser chamada de
boazinha, mesmo com a melhor das intenções, é o pior dos
desaforos.
Mulheres bacanas, complicadas, batalhadoras,
persistentes, ciumentas, apressadas, é isso que somos hoje.
Merecemos
adjetivos velozes, produtivos, enigmáticos.
As “inhas” não moram mais
aqui.
Foram para o espaço, sozinhas.
Martha Medeiros
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